14 de dezembro de 2009

12º Trabalho - A captura do cão Cerbero e o signo de Escorpião

Foi sem dúvida o mais perigoso dos trabalhos de Hércules e a sua mais extraordinária proeza. Com efeito, foi encarregado de ir aos Infernos, reino de Hades, para capturar o cão Cerbero. Todavia, não era qualquer homem vivo, mesmo que fosse um semideus, como era o caso de Hércules, que entrava no reino dos mortos impunemente. O nosso herói teve de submeter-se aos Mistérios de Elêusis, aos quais, naqueles tempos e segundo a lenda, apenas os Atenienses tinham acesso. Aquele que se iniciasse nestes mistérios seria capaz de entrar no outro mundo e sair dele vivo..
Para assistir a estes mistérios, Hércules teve de ser purificado, visto que ninguém que tivesse sangue nas mãos podia participar em tal cerimónia. Estes famosos mistérios, que tinham lugar em Elêusis - um porto da Grécia situado a noroeste de Atenas -, consistiam para o iniciado em reviver a vida e a morte de Dioniso, cujo nome significa "o deus coxo", mas também chamado "o deus duas vezes nascido". Ora, este deus foi considerado um libertador da Morte e dos Infernos, já que a lenda mítica relacionada com ele conta que libertou do reino de Hades a sua mãe, Sémele, que morreu fulminada pelo raio de Zeus, o seu marido, enquanto o desafiava mostrando toda a sua força. Assim, uma vez iniciado nos Mistérios de Elêusis, tal como Dioniso, Hércules já podia ir ao outro mundo sem temer pela sua vida. Isso já não é uma façanha mas um prodígio. Com a ajuda e a companhia de Atena e Hermes, Hércules empreendeu o caminho para os Infernos. Primeiro cruzou o Éstige, o rio que levava até ao Inferno, e depois penetrou no universo de Hades, o invisível.
Ao verem o nosso herói, os mortos entraram em pânico e fugiram. Apenas dois deles o esperaram. Em primeiro lugar foi Górgona Medusa, monstro e objecto de terror que congelava o sangue, com a sua cabeça rodeada de serpentes, os seus dentes de javali, as suas mãos de bronze, as suas asas de ouro e os seus olhos com um olhar tão penetrante, que quem se cruzava com ele ficava transformada em pedra.
Hércules estava prestes a atravessar Medusa com a sua espada quando Hermes o aconselhou a que não o fizesse, advertindo-o de que se tratava de uma sombra, uma ilusão, um fantasma. Depois, apareceu Meleagro, contra o qual Hércules estendeu o seu arco, disposto a atravessá-lo com uma flecha. Mas este herói grego limitou-se a contar-lhe a sua vida e, sobretudo, as circunstâncias trágicas da sua morte. Hércules emocionou-se tanto que lhe prometeu casar-se com a sua irmã, que ainda vivia, quando voltasse para os vivos. O nosso herói, como é de suspeitar passou por muitas mais aventuras e peripécias no reino dos mortos. Finalmente, encontrou-se com Hades, a quem explicou o objectivo da sua visita: capturar o cão Cerbero. Hades consentiu em aceder ao seu pedido, na condição de conseguir dominá-lo unicamente com as mãos, apenas revestido com sua couraça e sua túnica de pele de leão. Hércules agarrou o guardião dos Infernos pelo pescoço - visto que tinha três cabeças mas um só pescoço - e já não o soltou mais, até depois de um combate feroz e aterrador, durante o qual sofreu várias picadas do aguilhão de escorpião que o cão Cerbero tinha no extremo da sua cauda. Hércules saiu vitorioso.

Interpretação do décimo segundo trabalho e analogias com o signo de Escorpião
As alusões ao reino dos mortos e ao aguilhão que o cão Cerbero possui na cauda são símbolos evidentes que nos fazem pensar no oitavo signo do zodíaco, o qual quase sempre se compreende ou conhece mal, e que vemos tenebroso e negro, quando não pensamos que ele é maléfico. Porém, embora os elementos que constituem o pano de fundo do décimo segundo trabalho de Hércules sejam bem mais inquietantes, até mesmo angustiantes, a lenda que o conta está cheia de esperança e de vida. Não é por acaso que este é o último trabalho do semideus grego, visto que é a origem da sua maior vitória, uma vitória sobre a morte tal como a imaginamos e quase sempre a representamos, ou seja, tal como nos negamos a imaginá-la. Visto que a morte é algo que apenas acontece aos outros, claro. A nós não nos afecta. De maneira que toda a fantasmagoria em torno da morte e dos rituais aos quais nos submetemos quando a enfrentamos tornam-nos totalmente ignorantes do que é. Quem de nós pode arrogar-se não temer a morte? "Não temo a morte, mas o que me separa dela" escrevia Jacques Audiberti. Neste caso, tudo o que separa o reino dos mortos do dos vivos é o cão Cerbero, o guardião dos Infernos. Quem é o cão Cerbero, segundo a mitologia grega? O seu nome tem, sem dúvida, uma origem oriental e significa "demónio do abismo". O abismo, etimologicamente, é uma espécie de pleonasmo, já que para os Gregos significava "uma profundidade cujo fundo não se pode tocar". Agora, pensando bem, o que é que nos é dito com este pleonasmo, que é um puro exagero? Que o cão Cerbero, o demónio do abismo, é o guardião de algo que não existe, algo absurdo, algo que não tem nem sentido, nem fundo, nem fim. Mas se algo não tem fim, é algo que continua.
O que significa que o reino dos Mortos de Hades é pura ilusão, que se trata de um fantasma e nada mais, e que basta ser um iniciado - na lenda relativa ao décimo segundo trabalho, nos Mistérios de Elêusis - para poder sair incólume deste reino, do qual habitualmente não se regressa. Assim, da mesma maneira que a Medusa é uma sombra vã, tal como Hermes revela a Hércules, o reino dos mortos só existe na nossa imaginação. A própria morte não é outra coisa senão a ideia que fazemos dela. Os Infernos, aquele mundo onde os mortos estariam condenados a viver - ou, melhor dizendo, a não viver mais - eternamente, é uma impressão da mente. Passar do país dos vivos para o reino dos mortos, e depois voltar a sair para regressar para os vivos é uma imagem metafórica do grande princípio da regeneração própria do signo de Escorpião, cujo impulso é tanto de vida como de morte, de vida e de morte simultaneamente, representando este instante impensável onde a vida e a morte se tornam uma só, justamente para gerar uma nova vida. Ora, se a morte for parte da vida e nós amamos a vida, porquê ter medo da morte?
Hércules, ao compreender isto e cumprindo assim o seu último trabalho, pôde finalmente viver livre.

11º Trabalho - As maçãs de ouro das Hespérides e o signo de Gémeos


Segundo uma lenda mítica, o famoso jardim das Hespérides, símbolo da fecundidade, não era outro senão o jardim de Hera, mãe de Hércules, irmã de Zeus, no qual ela colocou ou plantou as maçãs de ouro, que Gea, personificação da Terra, lhe ofereceu como presente de casamento pela sua união com Zeus.
Quanto às Hespérides, cujo nome significa ninfas do Ocidente ou do Poente ou do Anoitecer, eram três deusas, efectivamente filhas da Noite, cuja função essencial consistia em vigiar o famoso jardim de Hera, mas, sobretudo, as maçãs de ouro. A primeira chamava-se Egle ("luz cega"), a segunda Eritia ("vermelha") e a terceira Hesperaretusa ("a noite violenta"), isto é, três nomes que descreviam o percurso do Sol desde que nasce até que se pões. Eram filhas de Atlante, chamado "o que suporta", o gigante que foi condenado por Zeus a levar sobre os seus ombros, não apenas o globo terrestre como erradamente se pensa, mas a abóbada celeste, por se ter revoltado contra os deuses do Olimpo. Em relação a Atlante, que teremos a ocasião de ver no momento em que Hércules vai cumprir este décimo primeiro trabalho, assinalaremos agora que as lendas gregas fizeram dele o rei da mítica Antárctida e o primeiro astrónomo que ensinou aos homens as leis do Céu. Mas, voltando às três Ninfas da Noite, que tinham como missão vigiar as maçãs de ouro oferecidas por Gea a Hera, diz a lenda que um dia Hera se deu conta de que as Hespérides lhe roubavam as suas preciosas maçãs. Para impedir que tocassem nos frutos excepcionais desta árvore, fez enrolar em volta do tronco uma serpente dragão, Ládon, cuja vigilância protegeria a macieira mágica. Este monstro tinha cem cabeças e sabia falar todas as línguas da Terra.
Hércules foi encarregado de roubar e trazer as maçãs da fecundidade. Para o conseguir, claro, teve de realizar uma grande viagem. No caminho, cruzou-se com Prometeu, a quem, atravessando com uma flecha a águia que lhe devorava o fígado, livrou desse castigo infligido por Zeus, por ter roubado a chispa de fogo da roda de Hélios, o Sol. Prometeu, chamado "o Prudente", aconselhou então Hércules a não colher ele próprio as maçãs de ouro, mas que utilizasse Atlante para o fazer. Às portas do jardim das Hespérides, Hércules propôs, então, a Atlante segurar na sua carga, isto é, colocar sobre a cabeça a abóbada celeste, enquanto ele, em troca, ia apanhar as maçãs. Mas o gigante Atlante, temendo a serpente dragão Ládon, não se atreveu a aproximar-se da árvore. Então, Hércules com uma só flecha, atravessou as cem cabeças do monstro, que morreu nesse mesmo instante. Mais tarde, Hera poria nos céus os despojos mortais deste ser monstruoso que se converteria na constelação do Dragão.
Outra tradição assegura que depois de ter morto Ládon, e enquanto Hércules suportava a abóbada celeste de Atlante, o gigante foi a jardim de Hera, fez com que as suas três filhas, as Hespérides, apanhassem três maças de ouro, que ele mesmo levou a Hércules, já que este tinha tido a gentileza de segurar na sua carga. Porém, o nosso herói, que tinha sido advertido por Prometeu para não se deixar enganar por Atlante (desejoso de ser libertar definitivamente do seu peso), rogou ao gigante que retomasse a sua abóbada celeste durante um instante, só o tempo de ele colocar uma almofada na cabeça.
Então, apoderou-se das maçãs que Atlante tinha deixado no chão e desapareceu com elas, deixando de novo a carga do gigante, que tinha acreditado ingenuamente no que Hércules lhe dissera.

Interpretação do décimo primeiro trabalho e analogias com o signo de Gémeos
Uma das mais flagrantes analogias das que participam nesta lenda mítica e o signo de Gémeos é o símbolo da fecundidade, da energia primordial, representada aqui pela serpente dragão que se enrola em volta da árvore e que é uma representação do famoso caduceu, atributo de Hermes-Mercúrio, regente indiscutível do signo de Gémeos, o astro deus que governa este signo. Claro que não podemos deixar de pensar também no não menos famoso jardim do Éden, onde se encontrava uma árvore idêntica, isto é, uma macieira, também guardada por uma serpente. Todavia, na lenda bíblica, Eva, que poderia ser muito bem qualquer uma das três Hespérides, deixa-se seduzir pela serpente, ao passo que na lenda que nos interessa agora Ládon se enrola à volta de uma árvore para obedecer a Hera, de modo que as Ninfas da Noite não possam roubar as maçãs.
Tudo leva a supor que as fontes de inspiração destas duas lendas, a grega e a bíblica, têm a mesma origem e provêm, simplesmente, de duas interpretações diferentes. Mas, finalmente, o seu sentido é idêntico. Com efeito, tanto num caso como noutro, trata-se de uma representação simbólica da inteligência ou da mente, unidas ao instinto primordial.
De maneira que a árvore é o homem; a serpente dragão o seu eixo vertebral, é a energia primordial que circula nele, e as maçãs de ouro são os frutos do conhecimento que possui desde sempre - pois os seus frutos do conhecimento já existiam na árvore antes da serpente dragão se enrolar à sua volta -, mas de que não está consciente enquanto não tiver a revelação. Esta revelação é a que Hércules obtém levando a cabo este décimo primeiro trabalho.
Com efeito, mata a serpente dragão que tem cem cabeças e fala todas as línguas da Terra. Dito de outra forma, tal como a mente, esta serpente pode aprender tudo, ouvir tudo, compreender e saber tudo. Mas desde que saibamos o que queríamos saber graças a ela, já não precisamos dela. Hércules pode até matar a serpente dragão da mente ou do intelecto, da qual sabemos também que quando toma o poder passa a ser, como se costuma dizer, o peixe que morde o rabo, as ideias que dão voltas e tornam estéril o espírito. Recordemos que o que Hércules tinha ido buscar eram os frutos do conhecimento. E se, por astúcia, se serve dos favores de Atlante para o fazer é porque o conhecimento e a verdade dão-se muitas vezes mais ao que mostra inocência, candura e pureza nas suas intenções, do que àqueles cujos móbeis são o ter, o saber e o poder.

11 de dezembro de 2009

10º Trabalho - Os bois de Gerion e o signo de Carneiro

Vejamos como Hércules com a ajuda de Hélio (o Sol) e Okeanos (o Oceano), que teve de vencer antes de se tornarem seus aliados, levou a cabo o seu décimo trabalho.
Gerion um gigante monstruoso que tinha três cabeças e três corpos, neto de Posídon e Calírroe - cujo nome significa "que flui agradavelmente" -, filha, por sua vez, de Okeanos ou Oceano, era rei de Tartesos, em Espanha, antiga cidade que se situava na actual Andaluzia e que foi destruída pelos Fenícios no ano 500 antes da nossa era. Assim, Gerion, chamado "o corvo", tinha fama de ser o homem mais forte da Terra. Possuía uma manada de bois, admirados pela sua beleza, e toda a gente os invejava. Euristeu recorreu a Hércules para se apoderar deles.
Para guardar a sua magnífica e valiosa manada, Gerion tinha procurado os serviços de um boieiro, Êurito - filho de Ares, o deus da guerra -, e de um cão com duas cabeças, Ortro, irmão do cão Cérbero, o cão de Hades, guardião do império dos mortos. Para desempenhar este trabalho, Hércules devia cruzar o mar, isto é, vencer Okeanos, filho de Urano, o deus do Céu, e de Gaya, divindade que personificava a Terra, que segundo uma lenda mítica grega, representava as água originais, o grande rio universal sem manancial nem final.
Ora, o único meio de prevalecer sobre Okeanos era apropriar-se da taça de Hélio, o Sol, que, claro, não o ia admitir, e assim, lançou os seus raios mortais sobre Hércules, enquanto este cruzava solitário, o deserto da Líbia sob um calor abrasador.
Furioso, o nosso lendário herói, parou no meio do deserto, pegou no arco e lançou flechas em direcção a Hélio. Este ordenou a Hércules que parasse e, assim feito, pediu desculpas. Para lhe demonstrar que não sentia nenhum rancor e selar um acordo, Hélio ofereceu-lhe a taça de ouro que Hércules necessitava para vencer Okeanos. Tinha forma de nenúfar e flutuava na água.
Hércules pôde levá-la para chegar à ilha de Eritia. Mas Okeanos fez mexer as ondas com tanta força, que a taça de ouro quase se virou e Hércules esteve em risco de se afogar. Outra vez furioso, pegou no arco e lançou flechas sobre o Titã dos mares que, assustado, parou as ondas. Foi assim que Hércules conseguiu chegar a bom porto; mas, mal pôs o pé na ilha, foi agredido por Ortro, que matou imediatamente com a sua massa. Êurito, o pastor da manada de Gerion, que correu a ajudar o seu cão, sofreu exactamente a mesma sorte. Assim, Hércules apoderou-se da manada de bois e apressou-se a levá-la consigo. Todavia, Gerion que tinha descoberto a intrusão de Hércules, desafiou-o para uma luta singular. Mas, como é de supor, o nosso herói conseguiu vencê-lo lançando-lhe uma flecha fatal que trespassou ou seus três corpos de uma só vez.

Interpretação do décimo trabalho e analogias com o signo de Carneiro
O que salta à vista quando descobrimos esta lenda mítica que nos narra a décima façanha deste personagem, que lhe estamos a mostrar sob outro ponto de vista, é que, de início, antes até de tentar apoderar-se da manada de Gerion, tem de vencer o Sol e o Oceano, isto é, a representação simbólica dos dois elementos primordiais: o Fogo e a Água. Também devemos fixar-nos atentamente que, embora estejamos diante de uma manada de bois e não de cordeiros como seria de esperar em relação ao signo de Carneiro, nos encontramos em presença do pastor e do seu cão.
Sabemos que no Zodíaco, o último signo é um signo de Água. Trata-se do signo de Peixes que, em analogia com a natureza e as estações, corresponde ao período em que as águas se precipitam, em que as fontes, os afluentes e os rios crescem e por vezes transbordam. É um período do ano que precede o equinócio da Primavera, o instante celeste durante o qual entramos na Primavera, evidentemente, e no signo Carneiro, o primeiro signo do Zodíaco mas, sobretudo, em que os dias serão mais longos do que as noites, em que o Fogo dominará.
Por isso, podemos considerar que, ao chegar à ilha de Eritia, Hércules atravessou as duas etapas. Recebe de Hélio (o Sol, o Fogo) uma taça de ouro que lhe permite vencer Okeanos (o Oceano, a Água). Simbolicamente, isto pode significar que para vencer os problemas emocionais que nos podem paralisar e conduzir à confusão total, ou afogar-nos - Okeanos remexe as ondas para virar a taça de ouro em forma de nenúfar, de Hércules - há que utilizar a cabeça, as energias activas, o ardor, a sua chama interior, todas estas qualidades próprias do signo de Carneiro.
Ora, se nos recordarmos, Gerion é neto de Posidon, o rei do mar, e o bisneto de Okeanos, o Oceano. Vinha de uma família dominada pela Água.
Daí, que, se Hércules deve arrebatar-lhe a sua manada, composta, como já dissemos, de magníficos bois, o gigante, pelo simples facto de possuir três cabeças e três corpos (isto é, um corpo, um espírito e uma alma divididos e não unificados), submergido em emoções hereditárias, para dizê-lo de outra forma, não está em condições de apreciá-lo, nem de o fazer evoluir. A esse respeito, sabemos que não existe uma grande diferença entre os bois e os cordeiros pois ambos se deixam guiar facilmente porque são fracos e submissos.
Mas é totalmente diferente de transformar um boi ou um cordeiro em carneiro, isto é, dar-lhe a possibilidade de ser o seu próprio pastor, o seu próprio guia, de afirmar-se enquanto indivíduo, dos pés à cabeça. O mesmo acontece com a planta que surge da terra ou de um rebento que se abre no princípio da Primavera, quando o Sol transita pelo signo de Carneiro: separa-se bruscamente do seu passado. Ao apoderar-se da manada de Gerion, o que Hércules alcança é a conquista da sua individualidade.

8 de dezembro de 2009

9º Trabalho - O cinturão da Rainha Hipólita e o signo de Peixes

Por uma vez o nosso lendário e mítico herói transformar-se-á em chefe guerreiro e, poderíamos dizê-lo, em almirante da Antiguidade. Visto que, para conquistar o cinturão da rainha Hipólita - o que teria feito sem verter uma única gota de sangue, se não se tivesse sentido traído pela que ostenta esse nome, como veremos -, Hércules fretou nove navios e embarcou com uma tropa de valentes voluntários. Com efeito, tratava-se de uma verdadeira expedição ao reino das amazonas, as míticas mulheres guerreiras, das quais tinha razões de sobra para temer. Mas comecemos a história do nono trabalho desde o princípio.
Desta vez foi a filha de Eristeu, Admete, cujo nome significa "a indomável", quem pediu a Hércules que fosse ao país das amazonas e roubasse o cinturão da sua rainha, Hipólita - nome que podemos traduzir literalmente como "cavalo desatado e solto" -, para depois lho levar. Ora, apresentar-se no país das "que não têm seio", ou seja, as amazonas, era uma aventura perigosa que poucos arriscavam. Mas claro que isso não fez recuar Hércules, consagrado à glória de Hera, "a protectora".
As amazonas, de quem se dizia serem filhas de Ares - o deus da guerra, Marte para os romanos - e de Náiade Harmonia - por sua vez filha de Ares e Afrodite -, nasceram, pois, de amores incestuosos entre Ares e sua filha. Viviam num país que os mitógrafos situam história e geograficamente no Cáucaso, ou então em Trácia, no nordeste da Grécia, ou em Escítia, nas planícies do Danúbio. Em todo o caso, eram totalmente autónomas, terríveis e temidas. Com efeito, ao não aceitar nenhuma presença masculina na sua comunidade, tinham a fama de mutilar os bebés masculinos ao nascer, cortavam-lhes os braços e as pernas e tiravam-lhes os olhos.
Apenas se uniam aos homens, a quem matavam em seguida, para satisfazer os seus amores carnais e procriadores de bebés do sexo feminino, a quem cortavam um peito para que assim as futuras amazonas pudessem manejar o arco e a flecha. Eram ferozes guerreiras e cavaleiras, armadas com arcos e com escudos em forma de meia luz. Todas usavam um capacete em pele de animal. A sua rainha, Hipólita, obtinha a sua força e o poder do seu cinturão.
Quando Hércules guiou a sua expedição para se apoderar do cinturão de Hipólita, as amazonas viviam nas margens do rio Thermodon. Ancorou no porto de Temiscira, na foz do rio. Hipólita adiantou-se-lhe e, conta a lenda que, seduzida pela sua força, os seus músculos e o seu carisma, lhe ofereceu o seu cinturão como prova do seu amor. Tudo podia ter terminado aqui se não fosse hera, disfarçada de amazona, ter difundido a notícia da traição da sua rainha entre as mulheres guerreiras. Estas, poucas de raiva, montaram os seus cavalos e iniciaram uma batalha de morte contra os homens que acompanhavam Hércules. Este último, achando-se por sua vez traído, matou Hipólita, de quem conservou o cinturão.

Interpretação do nono trabalho e analogias com o signo de Peixes
Se descobrirmos esta mítica lenda referente ao nono trabalho e pensarmos nas qualidades inerentes ao signo de Peixes, à priori não vemos muito bem qual pode ser a relação entre este cinturão, a rainha das amazonas e o último signo do Zodíaco. De facto, o vínculo é essencialmente o da emoção do amor puro, do qual pode nascer qualquer coisa, também emoções indomáveis que podem destruir tudo. O que a lenda não nos conta é que Admete, a indomável, era uma sacerdotisa de Hera, esposa de Zeus, o seu equivalente no Olimpo e, como tal, a deusa protectora das esposas. Consagrar-se à deusa das esposas pressupunha consagrar-se a um matrimónio decidido pelos deuses, tomado como a instituição mais sábia e mais normal. Estamos aqui no universo do que hoje em dia poderíamos chamar de matrimónio social ou de conveniência. Casamo-nos porque toda a gente o faz, para representar um papel social, procriar, entrar numa condição social, o que não exclui os sentimentos mas, possivelmente, despojados de toda a emoção.
Ora, as amazonas encarnam e representam completamente o oposto deste esquema social de segurança. São mulheres livres, guerreiras, impúdicas, ferozes, cruéis, que utilizam os homens para as suas necessidades, mas que não os amam e não querem ser amadas por eles. Em muitos pontos, são as caricaturas dos homens que elas mesmas recusam na sua vida, precisamente porque, também elas, mataram as suas próprias emoções. Assim, ser sacerdotisa de Hera ou amazona é o mesmo. Tanto num caso como noutro, a emoção é a que sofre ou se anula.
E o que escandaliza e rebela Hera - que chega inclusive a trair Hércules e, por isso, é a causa da verdadeira carnificina, pois o nosso herói teria podido cumprir o seu nono trabalho como quem não quer a coisa -, é que Hipólita, a selvagem e indomável amazona, seja capaz de amar. Visto que, não nos enganemos, embora a lenda passe por alto neste detalhe, tem a sua importância porque, ao entregar o seu cinturão a Hércules como prova do seu amor, Hipólita une-se a ele no sentido mais puro, mais profundo e mais verdadeiro. Trata-se de uma autêntica fusão carnal e espiritual entre o homem e a mulher; o homem, neste caso Hércules, encarnando a força da consciência dominada, e Hipólita encarnando o poder fecundador da emoção controlada. É um encontro, no mais alto, entre os princípios solar e lunar, sendo as amazonas, como podemos supor, mulheres-lua. Aliás, o cavalgar aterrador das amazonas representa o movimento circular das ondas e o desencadeamento das emoções desatadas, primitivas, que tudo destroem à sua passagem, do qual podem ser vítimas os nativos de Peixes, visto que aspiram ao amor fusão carnal e espiritual. Nadam na emoção, na receptividade. As suas múltiplas e contraditórias impressões são muitas vezes ofuscantes e inibidoras, outras são clarividentes e fecundas. De um modo absoluto, desejam juntar, unir e unificar todas as emoções e forças deste mundo, união simbolizada pelo cinturão de Hipólita.

7 de dezembro de 2009

8º Trabalho - As éguas de Diómedes e o signo de Sagitário

A pergunta é: éguas ou garanhões? Isto é o que teremos a ocasião de nos interrogarmos em relação ao oitavo trabalho de Hércules e suas analogias com o signo de Sagitário. Com efeito, segundo as duas lendas míticas que relatam esta façanha cumprida pelo nosso herói, mas também segundo as interpretações que os mitógrafos fazem dela, tanto poderia tratar-se de éguas como de garanhões. Em todo o caso, lenda e mitógrafos estão de acordo que, éguas ou garanhões, trata-se de quatro cavalos selvagens, cujos nomes hoje em dia continuam a ser conhecidos: Podargo ou o "Pé Brilhante", Lâmpon ou o "Resplendor". Janto ou o "Amarelo" e Deino ou o "Terrível". Pertenciam a Diómedes - cujo nome significa "hábil como um deus" -, rei da Trácia, região situada entre o Danúbio, o mar Negro e o mar Egeu e que foi colonizada pelos Gregos no século VII antes da nossa era. As raízes indo-europeias dos povos que, desde o II milénio antes de Cristo, se estabeleceram nesta magnífica região rica em madeira, ouro e prata são evidentes. Por isso, entende-se a razão pela qual os Gregos a ocuparam, e já veremos que isto tem a sua importância na interpretação que faremos desta lenda mítica, com Trácia como pano de fundo.
O rei da Trácia, Diómedes, era filho de Ares, o deus da guerra, a quem os Romanos chamaram Marte, e de Cerne, chamada a "Perita em Arreios", mas também a "Rainha Soberana", uma ninfa tessalónica. Outra lenda apresenta-a como uma deusa caçadora que lutou apenas com as suas mãos com um leão que acabou por domar, foi seduzida por Apolo e teve dele outro filho, Aristeu, que depois se converteu em rei da Líbia. Como vemos, ao longo dos séculos, as lendas míticas entrecruzam-se muitas vezes e misturam-se.
Voltemos a Diómedes, rei trácio, cujas cavalariças semeavam terror. Com efeito, as suas quatro éguas - ou garanhões -, atadas por correntes de ferro aos seus bebedouros de bronze, tinham a particularidade de serem carnívoras, e Diómedes alimentava-as com carne humana. De maneira que Hércules foi encarregado de capturar os quatro cavalos, o que fez com a valentia, a força e o talento que o caracterizavam. Chegou à Trácia completamente sozinho, apresentou-se diante de Diómedes, a quem matou com a sua famosa moca, e arrastou o seu corpo inerte até à margem de um grande lago artificial que ele mesmo tinha construído, fazendo um túnel entre as terras baixas e o mar e entregou-o aos quatro cavalos selvagens e carnívoros que, entretanto tinha libertado e instalado sobre um outeiro rodeado pelas águas do lago. Uma vez alimentados com a carne do rei da Trácia, os cavalos, cuja voracidade se tinha acalmado, puderam ser capturados docilmente por Hércules, que cumpriu assim vitoriosamente o seu oitavo trabalho.

Interpretação do oitavo trabalho e analogias com o signo de Sagitário

Por se encontrar na presença de quatro cavalos selvagens, o vínculo com o signo de Sagitário, representado simbolicamente por um centauro, isto é, um ser monstruoso, cujo busto, braços e cabeça são de um homem, e cujo corpo e patas são as de um cavalo, é fácil de compreender. Porém, a pergunta é se aparece algum centauro nesta lenda. Uma das particularidades do centauro é justamente a de se alimentar de carne humana. Daí que possamos deduzir que as quatro éguas ou garanhões de Diómedes eram centauros encobertos.
Mas afinal trata-se mesmo de quatro éguas ou de quatro garanhões? Na realidade, segundo as qualidades inerentes ao signo de Sagitário, vamos ver que se trata tanto de éguas como de garanhões, mas no estado mais selvagem imaginável. Com efeito, este signo, como indica a dupla natureza humana e animal do centauro mítico que o representa, entra ao mesmo tempo em relação com as camadas mais profundas, primárias e primitivas da natureza terrestre e com as zonas mais elevadas, superiores e espirituais do mundo celeste. Mas tanto num caso como noutro, quando as fortes energias, ao mesmo tempo primitivas e divinas, que o homem tem dentro de si não se dominam, não se canalizam, não se controlam para um determinado propósito, numa determinada direcção, indicada pela seta que aponta o centauro que representa Sagitário, o homem afunda-se quer nos excessos de sensualidade, no desenfreamento e na morte física, quer nos da celebridade, da intelectualidade e do saber estéreis. Visto que o saber, que muitas vezes tem algo de sentencioso, não é o conhecimento generoso, aberto e benévolo que conduz à sabedoria. A prova está em que ao signo de Sagitário são atribuídas qualidades de expansionismo, colonialismo, ao mesmo tempo que boas intenções, acerca das quais um provérbio diz, de que o inferno está cheio.
Assim, compreendemos melhor porque é que o cenário do oitavo trabalho de Hércules se situa na Trácia, região colonizada pelos Gregos, que ansiaram pelas suas riquezas naturais. O nativo de Sagitário, tal como o centauro, tem por missão unificar a sua cabeça com o seu corpo, o seu espírito com a sua carne, o seu componente masculino e cerebral, por um lado, e o seu componente feminino e instintivo, por outro. Mas quase sempre é vítima da sua actividade cerebral que domina a sua natureza selvagem e indomável, incitando-o depois a jogar a sua vida mais do que vivê-la, ou então sofre um frenesim dos sentidos e dos instintos que o tornam selvagem e indomável, incapaz de se dominar e de se conter. Eis porque a dúvida surge em redor do sexo dos quatro cavalos de Diómedes que são, efectivamente, tanto éguas de instinto descontrolado, como garanhões de loucura cerebral, embora também possam ser os cavalos do espírito e do corpo unificados.

6 de dezembro de 2009

7º Trabalho - O touro de Creta e o signo de Touro

Minos, o rei da montanhosa ilha de Creta, que se dizia, por vezes que era filho de Zeus e de Europa e, como tal, um semideus, tinha prometido a Poseidon, o deus do mar, que sacrificaria em seu nome o primeiro ser que aparecesse nas águas. Pegando-lhe na palavra, Poseidon fez surgir das águas do Mediterrâneo um touro milagroso, de tamanha beleza, de uma força ímpar e de tal forma majestoso que Minos ficou maravilhado. Violentando a sua promessa, capturou o touro de Poseidon e escondeu-o nas suas próprias manadas; mas o deus do mar, ao inteirar-se de que Minos estava a traí-lo, enfureceu o touro que ele mesmo tinha criado, e -lo tão bem que o animal devastou Creta. Lançando fogo pelo nariz, queimava e destruía as culturas dos campos, as árvores e os frutos dos pomares.
Assinalemos que, segundo outras fontes, este famoso touro não era uma criação de Poseidon, mas a forma que tinha tomado Zeus para sequestrar e seduzir Europa, a mãe de Minos. Finalmente, uma terceira versão sugere que se trata do não menos famoso Minotauro, guardião do labirinto. Com efeito, este monstro com corpo de homem e cabeça de touro é o filho de Pasifae, que não era outra senão a esposa de Minos.
Embora os mitógrafos preferissem a primeira versão desta lenda, nós compreendemos facilmente porque os outros dois touros não lhe são alheios, já que, tanto num caso como noutro, se referem sempre a Minos. Em todo o caso, Hércules teve por missão capturar este touro furioso e devastador, que deitava fogo pelo nariz, cuja selvajaria só era igual à sua força indomável, para devolvê-lo vivo à Grécia.
Conseguiu vencê-lo com as mãos nuas durante um combate mítico e titânico, unicamente com a força dos seus músculos, imobilizando-o pelos chifres. Finalmente, levou-o para a Grécia, carregando-o nos próprios ombros.

Interpretação do sétimo trabalho e analogias com o signo de Touro
A analogia com o signo de Touro é flagrante pelo simples facto de que, para cumprir o seu sétimo trabalho, Hércules enfrenta o animal mítico, representação do segundo signo do Zodíaco. No entanto, atribuímos quase sempre a este signo as qualidades de força contida, de sensualidade, de aspiração a viver em harmonia com a natureza, de vida tranquila, saudável, serena e simples.
Sem dúvida que o astrólogo sabe que os arrebatamentos do nativo de Touro podem revelar-se temíveis. Todavia, trata-se de um ser mais rancoroso do que violento. Por outro lado, a sua necessidade de segurança e de conforto material leva-o à conservação, não à destruição. Com efeito, não esqueçamos que, em correspondência com os ciclos da natureza, o período do ano durante o qual o Sol atravessa o signo de Touro é o da reprodução e da procriação. Por isso, não podemos evitar ver na representação deste touro vingador, destruidor, que lança chamas pelo nariz, características próprias do signo oposto a Touro - Escorpião -, visto que embora este sétimo trabalho cumprido por Hércules esteja em analogia com o signo de Touro, não é por acaso que faz alusão às forças destruidoras do instinto desbragado, aos ímpetos da própria vida de Touro... que também são ímpetos de morte que se atribuem ao signo de Escorpião. Devemos compreender que, na realidade, estes ímpetos de vida e de morte são uma e a mesma coisa. Formam um todo que produz a vida. Podemos entendê-lo observando o bater constante do coração humano, que se contrai e vive, se relaxa e morre, aproximadamente 66 vezes por minuto. Assim, sem nos apercebermos, todos nós vivemos e morremos 66 vezes por minuto. Estas sístoles e diástoles que dão ritmo aos batimentos do nosso coração bombeiam o sangue e regeneram-no. Esta maravilhosa mecânica orgânica entra em relação com os instintos da vida e da morte e, consequentemente, com o eixo Touro-Escorpião do Zodíaco. Ora bem, o que nos diz a lenda do sétimo trabalho de Hércules? Revela-nos que Minos se apoderou do presente que Poseidon lhe tinha dado e que aquele tinha prometido sacrificar. Mas, em vez de o fazer, deslumbrado com a sua beleza e a sua força, optou por enganar Poseidon e conservar este fabuloso animal forjado pelo mar original, como Vénus. Ao fazê-lo, Minos cedeu aos instintos de conservação. Cedeu perante as fraquezas atribuídas ao signo de Touro: posse, egoísmo, imobilidade. Mas, embora pareça um paradoxo, a vida não pode existir, durar e seguir o seu curso normal, se não morrer, se num dado momento não se interromper para se regenerar e renascer em si mesma. É este o sentido de sacrifício do touro sagrado na Antiguidade, representado nos rituais dedicados a Dioniso, deus da videira e do vinho, ambos em analogia com o sangue. Igualmente, o mito de Jesus foi comparado muitas vezes com o de Dioniso, no sentido de que, tanto a um como a outro, foi exigido um sacrifício último.
Além disso, segundo eles, a vida e a morte confundem-se e, por último, o vinho simboliza o sangue ou a vida que morre e se regenera. Porém, a morte obtida por um sacrifício não se retém. É uma etapa necessária, uma necessidade vital.
Não se trata da morte, tal como a entendemos normalmente, ou seja, o final da existência humana. Enquanto a vida desviada do seu curso normal, retida, conservada, imobilizada, possuída de forma egoísta, morre definitivamente, pelo simples facto de que de que já não tem nenhuma possibilidade de se regenerar. É esta a falta que Minos comete, ao guardar para si o touro nascido do universo mítico de Poseidon, o mar, as águas originais de onde nasce a vida. Foi esta a falta que Minos cometeu e que Hércules reparou, combatendo e dominando o touro de Creta apenas com as mãos.

1 de dezembro de 2009

6º Trabalho - As aves do Lago Estinfália e o signo de Aquário

Para cumprir o seu sexto trabalho, Hércules foi desafiado por Euristeu para destruir as aves de rapina que devastavam a região e as ribeiras do lago Estinfália, na Arcádia. Essas aves, consagradas a Ares, ou seja, Marte, o deus da guerra, tal como a lenda as descreve, poderiam ter saído directamente de um livro de ficção científica.
De tamanho bastante parecido com o do grou ou da garça, assemelhavam-se antes a um íbis, a ave mítica egípcia, mas o seu bico direito, as suas patas, as suas asas e as suas penas eram de bronze. Matavam e destruíam até ao fim os animais e os homens que viviam ou passavam por esta região, os quais envenenavam. Os seus excrementos tinham tornado estéreis todas as terras que sobrevoavam. Por último, para se alimentarem, devastavam as árvores de fruto, as hortas e as colheitas das regiões vizinhas. Estas aves que se refugiaram nos sombrios bosques que rodeavam o lago Estinfália, eram uma verdadeira praga. Como ninguém as caçava nem ninguém era tão poderoso para as enfrentar, reproduziam-se interminavelmente. Eram pois, bastante numerosas. Para evitar os seus danos, os homens deveriam ter-se unido, mas negavam-se a isso. Ora, o que impressionou Hércules quando chegou à região da Arcádia, onde se encontrava o lago em questão, foi o seu número elevado.
Como vimos, tanto neste caso como no anterior, trata-se de uma espécie de desastre ecológico, culpa da negligência do rei Augias no primeiro, e da resignação dos homens que carecem de espírito solidário face às forças destruidoras, no segundo. Com o fim de exterminar estas famosas aves, Hércules teve de resolver dois grandes problemas: em primeiro lugar, para alcançar os inexpugnáveis bosques nos quais as aves tinham os seus ninhos era preciso atravessar umas águas pantanosas que eram verdadeiras areias movediças. Em segundo lugar, estas aves, ao multiplicarem-se sem limites, eram de tal maneira numerosas que não é difícil imaginar que Hércules nunca conseguiria matá-las com o seu arco e as suas flechas.
Perplexo, o nosso herói não sabia o que fazer quando Atena, a deusa guerreira, lhe apareceu e entregou um par de castanholas, feitas do mesmo material que o bico, as patas e as asas das aves e fabricadas por Hefestos, "o que brilha durante o dia", o deus do fogo. Então, com este instrumento provocou um ruído ensurdecedor em toda a região e expulsou as aves enlouquecidas. E enquanto estas levantavam voo dando às asas em desordem, Hércules matou o maior número possível com as suas flechas. Foi assim que cumpriu o seu sexto trabalho, devolvendo à região do lago Estinfália a sua tranquilidade, o seu encanto e a sua prosperidade.

Interpretação do sexto trabalho e analogia com o signo de Aquário
Em princípio, a julgar pelos símbolos que encontramos nesta lenda, temos a sensação de estar imersos no universo do signo de Carneiro, mais do que no de Aquário. Não nos é dito pois, que as aves do lago Estinfália são consagradas a Ares, o deus da guerra, que não é outro senão Marte, o regente do primeiro signo do Zodíaco? Por acaso estas aves não têm um bico, umas patas, umas asas e umas penas de bronze, que nos leva a pensar que estão cobertas de armaduras e que se trataria neste caso de guerreiros? E, por último, não é a deusa da guerra Atena quem oferece a Hércules o instrumento graças ao qual poderá pôr fim às ditas aves? Estamos aqui muito longe dos símbolos que eram atribuídos a Saturno e a Urano, primeiro e segundo regentes do signo de Aquário, isto é, seguindo com os deuses gregos, Crono e Urano.
E, no entanto, como iremos descobrir em seguida, esta lenda faz alusão efectivamente ao décimo primeiro signo do Zodíaco. Em primeiro lugar porque estas aves em grande número nos lembram um exército na sombra, semeando o terror, a destruição, a morte, e que o bronze do seu bico, patas, asas e penas é um metal que simboliza a força militar invulnerável e não a força de um guerreiro solitário. Depois, porque estas aves parecem formar um único e mesmo corpo, uma única e mesma entidade que os homens da região, por falta de solidariedade, se vêem impotentes para combater e caçar. Por último, porque a situação que castigava a região do lago Estinfália e o comportamento das aves que o invadiam e devastavam eram totalmente anárquicos.
A combinação de astros que regem o signo de Aquário, Saturno-Urano, é temível, visto que revela uma espécie de extrema determinação impulsiva, a que nada nem ninguém parece conseguir opor-se. Com efeito, trata-se então do deus do tempo, Crono, e o do céu, Urano, que se unem a um modo de representações do destino ou da fatalidade a que Crono se refere, e da liberdade de espaços infinitos, de tudo o que é passível de acontecer, e consequentemente do livre arbítrio. E isto é justamente o que o pode tornar versátil e por vezes tão instável, já que durante muito tempo oscila entre estas duas opções. Está perplexo, tal como Hércules quando enfrentou os problemas postos com a destruição das aves. Todavia, o nativo de Aquário, ao ter um aguçado sentido de oportunidade, vê-se quase sempre favorecido pelas circunstâncias e, consequentemente, pelo destino, que lhe dá a oportunidade de exercer o seu livre arbítrio.. Atena, pois, vem em auxílio de Hércules e entrega-lhe o instrumento que lhe permite caçar as aves ou, simbolicamente, exercer o seu livre arbítrio: castanholas ou, como a etimologia deste nome indica, pequenas castanhas, os frutos do castanheiro, a árvore que simboliza a previsão.
Prever e antecipar, agir e reagir antes de mais alguém, porque sabe o que se vai passar, tal é a grande qualidade potencial do signo de Aquário que, se a adquirir, lhe permitirá ser dono do seu destino e exercer plenamente o seu livre arbítrio.