Depois de ter ganho a firmeza de espírito com o seu primeiro trabalho e a justiça com o segundo, Hércules perseguirá durante um ano uma virtude igualmente grande, simbolizada neste caso por uma corça de unhas de bronze e de cornos de ouro, nos quais o sol brilhava, e cujo corpo era tão grande e maciço que, ao princípio a confundiram com um veado em lugar de uma corça.
No entanto, segundo reza a lenda original do terceiro trabalho imposto a Hércules, tratava-se de uma corça, a mesma que foi dedicada à deusa Artemisa, depois desta a ter perseguido até à colina de Cerinea, onde aquela se refugiou.
Com efeito, ao princípio, com outras quatro corças - que Artemisa, a futura Diana caçadora dos Romanos, prendeu ao seu carro -, a protagonista desta história fazia parte de um grupo de cinco, que teve de abandonar para não cair nas mãos da deusa Artemisa-Diana e ser amarrada ao seu carro. Porém, a divindade não renunciou à corça, a qual, finalmente, lhe foi dedicada.
Este facto provocou a ira de Hera, inspiradora dos Doze Trabalhos de Hércules, a quem exigiu então que fosse apanhar a corça de Cerinea sequestrada por Artemisa, sem fazer uso da força. O nosso herói perseguiu-a, pois, durante um ano inteiro, transgredindo assim o tabu, visto que o animal era sagrado porque era dedicado à deusa Artemisa.
Uma lenda anterior à do terceiro trabalho reza que a corça de Artemisa foi, por um tempo, Táigete, uma das Plêiades, ou seja, uma das sete filhas do gigante Atlas, que carregava a Terra aos ombros, e cujas filhas, mais tarde, se converteram nas sete estrelas da constelação das Plêiades. Com efeito, para esconder Táigete - a quem Zeus acossava assiduamente -, Artemisa transformou-a em corça. Então, foi Táigete, reza a lenda que, como agradecimento e depois de ter recobrado a sua forma original de deusa, dedicou a Artemisa esta corça que lhe tinha permitido escapar dos desejos imperiosos de Zeus.
Claro que este episódio tem a sua importância se se quiser compreender o significado simbólico do terceiro trabalho executado por Hércules. Imaginamos que esta corça corria muito depressa. Por isso, Hércules teve grande dificuldade em apanhá-la. Como já especificámos, necessitou pelo menos de um ano para, finalmente, quando a corça se preparava para atravessar um rio e entrar no país lendário e mítico dos sábios Hiperbóreos, a surpreender: esticou o seu arco e atirou-lhe uma seta, cuja ponta penetrou justamente entre o osso e o tendão das duas patas dianteiras. Assim, sem derramar nem uma só gota de sangue, imobilizou-a; visto que, segundo as ordens de Hera, não deveria matá-la nem feri-la. Assim, pôde carregar o animal sobre os seus largos ombros e transportá-lo até Micenas, cidade que se julga ter sido o berço da língua grega, historicamente, entre os séculos XVIII e XV antes da nossa era.
Interpretação do terceiro trabalho e analogias com o signo de Caranguejo
À primeira vista, parece que existem muito poucos pontos em comum entre os mitos e os símbolos presentes neste terceiro trabalho e os que conhecemos e relacionamos com o signo de Caranguejo.
Porém, se observarmos com atenção, trata-se de uma analogia que salta à vista: a lenda do terceiro trabalho conta-nos efectivamente em pormenor o que Hércules fez para capturar a corça sagrada sem a ferir e muito menos matá-la. Atirou-lhe uma seta que atravessou as suas patas dianteiras, entre o tendão e o osso, como é especificado, sem derramar uma única gota de sangue.
Ora, recorde-se que o caranguejo do signo com o mesmo nome vem do grego karkinos, que significava "caranguejo", "câncer", assim como "pinças" e "compasso". Não é o que fazem lembrar as duas longas patas, um compasso? A seta que atravessa as duas patas da corça não evoca o travessão que une as duas pernas do compasso?
No entanto, as duas protagonistas do terceiro trabalho de Hércules são, sobretudo, Táigete, personificada pela própria corça de Cerinea, e Artemisa, a quem o animal foi consagrado.
Quem era Artemisa? Esta deusa grega, cujo nome significava "grande fonte de água", era uma rapariga virgem, muito bela, armada de arco e que passava a maior parte do tempo a caçar veados e humanos. Feroz e colérica, foi comparada à Lua, assim como seu irmão Apolo era a personificação do Sol.
É óbvio que vemos imediatamente uma segunda analogia com o signo de Caranguejo: Artemisa, a deusa a quem foi consagrada a corça de Cirenea, é uma figura da Lua, o astro que rege o signo de Caranguejo.
Quanto a Táigete, cujo nome significa "reprimida durante muito tempo", devemos precisar que Zeus só a amou uma vez e, mais tarde, tomando a forma de uma corça, desapareceu por iniciativa de Artemisa, para poder escapar das repetidas perseguições do deus dos deuses do Olimpo. Todavia, da sua união com Zeus nasceu um filho, Lacedémon, ou o demónio do lago. Então, porque é que esta corça é tão bela e porque é que Hércules a perseguiu durante um ano com a missão de a capturar se a ferir? Porque é, sem dúvida, a mais formosa representação mítica e simbólica da mais bela das mulheres: a Sofia dos Romanos, a Sabedoria.
Com efeito, a corça de Cerinea é consagrada a Artemisa, a Lua, tem cornos de ouro nos quais brilha o Sol, reforçando a força que reside nela, as patas de bronze que a ligam à Terra, a dos bens materiais e a dos desejos terrenos. Possui uma certa inocência, tal como os nativos de caranguejo, visto que Zeus se uniu a ela contra sua vontade.
No entanto, alimentou no seu seio um demónio, o seu filho Lacedémon, o demónio do lago.
Porém, fugiu para o país mítico das origens e, uma vez mais tal como os nativos de Caranguejo, olha para o seu passado, o país da pureza e sabedoria originais.
Sendo assim, depois de ganhar a firmeza de espírito e a justiça, Hércules adquiriu a sabedoria apoderando-se da corça de Cerinea.
1 comentário:
De fato sao analogias bem interessantes, parabens, sem palavras para expressar a admiraçao desse estudo tao aprofundado.
Abraços!
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